A
quarta-feira será animada em Brasília. Está prevista na Comissão de
Constituição e Justiça do Senado a sabatina de Luís Roberto Barroso,
futuro ministro do Supremo. Há um esforço para que o nome seja apreciado
no plenário em seguida. No mesmo dia, o tribunal pode decidir o destino
da liminar concedida pelo ministro Gilmar Mendes, que suspendeu a
tramitação do projeto que limita a criação de novos partidos (ver post
específico a respeito nesta segunda). As duas questões são muito
importantes, mas é evidente que a assunção de um novo ministro merece
especial atenção porque diz respeito ao futuro da Corte e do país. Já
dei destaque a trechos polêmicos de
um dos livros de Barroso, chamado “O Novo Direito Constitucional
Brasileiro”, que traz por subtítulo “Contribuições para a construção
teórica e prática da jurisdição constitucional no Brasil”. Já tentei
saber o que é esse tal “neoconstitucionalismo”. Já conversei com alguns
especialistas. Ninguém consegue explicar direito. Uma definição possível
para ele seria “Novo Arbítrio das Luzes”, que poderia ser assim
caracterizado: um grupo de supostos iluminados, considerando-se dotado
de uma razão superior, acha que pode ignorar as leis democraticamente
pactuadas para fazer justiça. Assim, em vez de valer o que está escrito
nos códigos, vale o que faz “avançar a luta”. Mas qual luta e luta de
quem? Ora, de quem outorga a si mesmo o poder para ignorar a lei.
Entenderam?
Já expus
algumas coisas que o doutor andou pensando sobre temas que patrocinou na
Corte, como a liberação do aborto de anencéfalos e a união civil entre
homossexuais. Mas não vou repisar argumentos. O link vai acima. Quero
aqui tratar de outro assunto, sobre o qual o doutor discorre em seu
livro: a sua luta para manter no Brasil o terrorista italiano Cesare
Battisti. Transcreverei trechos, alguns realmente surpreendentes, um
tanto estupefacientes até. A partir da página 510, ele recorre ao etilo
da crônica ligeira para contar “O que ninguém ficou sabendo”. A partir
de agora, tudo o que aparecer em vermelho é extraído do livro. Meus
comentários seguem em preto. Barroso tenta demonstrar, vejam vocês, que
teve de enfrentar o preconceito da imprensa… Vamos lá.
Nem tudo o
que aconteceu, de bom e de ruim, eu posso contar ainda. Mas a condução
do caso foi uma experiência de vida. A começar pelas visitas periódicas à
Papuda. Por não ser um advogado criminal, idas a penitenciárias e
delegacias nunca fizeram parte da minha rotina. Mas certamente faz parte
de uma vida completa no Direito. E ali se tem a confirmação de que é
possível conservar a dignidade, mesmo nas condições mais indignas. De
parte isso, a convivência com a adorável escritora francesa Fred Vargas,
sua irmã Jo e com um conjunto de pessoas idealistas e despojadas que
apoiavam a causa trouxe-me particular proveito ao espírito. Entre essas
pessoas, merece destaque a figura singular do Senador Eduardo
Suplicy, um homem de bem e de espírito elevado, que vive em uma dimensão
ligeiramente diferente das demais pessoas. O jornalista Mário Sergio
Conti, na época diretor-geral da Revista Piauí, foi um interlocutor de
primeira linha em diversos momentos importantes e, por mais de uma vez,
prestou a mim e ao Cesare valiosa ajuda na relação com a imprensa.
Na Papuda, o Delegado da Polícia Civil do Distrito Federal Márcio
Marquez de Freitas e os agentes policiais Adelmo Rodrigues da Conceição
Junior, Hélio Augusto de Oliveira Rezende, Ismar Santos Resende e
Roberto Carlos Chagas Rodrigues, com extrema civilidade, tomaram nossa
vida melhor e mais fácil.
Também foi
uma experiência dura, mas um grande aprendizado, trabalhar em um caso
com a totalidade da imprensa contra. Não era fácil contar a história
real nem divulgar notícias favoráveis. Por exemplo: quando o
Procurador-Geral da República, Dr. Antônio Fernando de Souza, após a
concessão do refúgio, deu um parecer favorável, pedindo a extinção do
processo de extradição, nenhum veículo fez do fato uma notícia
importante. Como era. Diante da falta de espaço na parte noticiosa dos
jornais e revistas, escrevi inúmeros artigos para a página de
opinião de diversos jornais, como a Folha de S.Paulo, O Globo, Correio
Brasiliense, Blog do Noblat, Consultor Jurídico e Migalhas.
Merval Pereira, de O Globo, a despeito de sua posição pessoal contrária à
causa, abriu espaço na coluna para a apresentação dos argumentos de
defesa. Com um importante jornalista, de um influente veículo, mantive o
seguinte diálogo: “Cesare Battisti jamais foi acusado ou condenado por
terrorismo. Sua qualificação como terrorista é errada e se
insere na propaganda depreciativa da Itália”. Respondeu-me ele: “Mas
essa posição faz parte da linha editorial do nosso veículo”. Um tanto
perplexo, procurei argumentar: “Essa não é uma questão de linha
editorial. É um fato. E fatos devem ser noticiados de maneira correta”.
De longa data acho isso: as pessoas têm direito a sua própria opinião,
mas não aos próprios fatos. A esse propósito, e por justiça,
registro que Felipe Recondo, do Estado de S.Paulo, fez a cobertura que
separou, da maneira mais própria, o que era opinião do que era a
divulgação de fatos. E Rodrigo Haidar, do Consultor Jurídico, é quem faz
uma das melhores coberturas do Supremo Tribunal Federal da imprensa
brasileira. Em anexo a esse texto, publico uma matéria dele sobre o
caso. Narro três episódios a seguir.
Então vamos comentar
1: Começo pela concordância. Também acho que Eduardo Suplicy transita numa dimensão diferente da de outras pessoas… O que me diferencia de muita gente é considerar que o que parece sincera ingenuidade é método.
1: Começo pela concordância. Também acho que Eduardo Suplicy transita numa dimensão diferente da de outras pessoas… O que me diferencia de muita gente é considerar que o que parece sincera ingenuidade é método.
2:
Notem que doutor Barroso tem ideias muito precisas sobre a imprensa.
Sim, claro, ele defende a “liberdade de opinião”, desde que os fatos
registrados estejam corretos. Cabe a pergunta: no caso de alguém achar
que os fatos estão “errados”, deve-se fazer o quê? Os que defendem o
Conselho Federal de Jornalismo e o controle social da mídia dizem querer
impedir a “distorção dos fatos”. Quem é o juiz, doutor? Qual é o
tribunal?
3:
Notem que, segundo Barroso, a “totalidade da imprensa” estava contra. É
mesmo? Não obstante, ele conta com a colaboração de um jornalista,
Mário Sérgio Conti — que era diretor da revista Piauí (???) —, que, nas
suas palavras, prestou “valiosa ajuda na relação com a imprensa” a ele
próprio e ao terrorista Battisti.
4:
A imprensa estava tão hostil que o doutor confessa — fruto, suponho, da
“valiosa ajuda” — ter publicado “inúmeros artigos” na Folha, Correio
Braziliense, Consultor Jurídico, Blog do Noblat e Migalhas. Merval,
importante colunista do Globo, abriu espaço para os argumentos de
defesa. Há os agradecimentos a Felipe Recondo, do Estadão (é muito justo
que o advogado de Battisti o faça, noto desde logo)… Que diabo, então,
de imprensa “hostil” é essa? Até quem, como Merval, era sensatamente
contra o refúgio ao terrorista lhe concedeu espaço.
5:
Parabenizo a eficiência de Barroso e de Conti. De fato, a partir de
certo momento, a imprensa parou de chamar o terrorista de “terrorista”.
No dia 27 de junho de 2011, observei neste blog:
“Vocês se lembram quantas vezes reclamei aqui do fato de a imprensa brasileira, com raras exceções, chamar Cesare Battisti de “ativista”. Até brinquei: “Vai ver os passivistas são aqueles que ele matou…”. Os mais finórios iam ainda mais longe: Battisti seria um “ex-ativista”. O delinqüente raramente é chamado por aquilo que é: um terrorista”.
“Vocês se lembram quantas vezes reclamei aqui do fato de a imprensa brasileira, com raras exceções, chamar Cesare Battisti de “ativista”. Até brinquei: “Vai ver os passivistas são aqueles que ele matou…”. Os mais finórios iam ainda mais longe: Battisti seria um “ex-ativista”. O delinqüente raramente é chamado por aquilo que é: um terrorista”.
6:
Vejam que coisa… O futuro ministro do Supremo faz crônica ligeira,
quase amorosa, de um fato que levou a Corte ao ridículo, que a pôs de
joelhos. O STF considerou refúgio ilegal, mas atribuiu ao presidente a
formalidade de expulsar Battisti. Era a quadratura do círculo. Lula
decidiu que ele ficaria. Logo, ficava, então, contra a lei. Assim, o que
o Supremo decidiu naquele dia, para aplauso do doutor, é que, sob
certas circunstâncias, existe uma pessoa acima da lei no país: o
presidente.
7:
E cumpre desfazer aqui um truque um pouco vulgar de jurista considerado
tão brilhante. A Itália só não condenou Battisti por terrorismo por
razões processuais: porque queria evitar justamente a alegação canalha
de que seus crimes eram atos políticos.
8:
Não sei que jornalista disse aquela porcaria ao doutor: “Ah, eu sei que
ele não é terrorista, mas o meu jornal…”. Isso é, vênia máxima, uma
fantasia meio boboca. Eu poderia escrever algo assim: “Outro
dia, conversei com um constitucionalista, e ele me disse que sabia que
seus argumentos eram intelectualmente fraudulentos, mas que, no mundo do
direito, as coisas são assim mesmo. O importante é ganhar…”.
Qual é a diferença entre o interlocutor de Barroso e o meu? Com essa
suposta “revelação”, o futuro ministro do Supremo joga uma sombra de
suspeição sobre a imprensa e alimenta a voracidade dos pterodáctilos que
defendem a censura. Mas as coisas ainda vão piorar bastante.
Um vídeo
Na sua egologolatria como advogado — vamos ver como será no tribunal —, doutor Barroso falou pra chuchu. E acho que acabou dando “bom dia!” a cavalo. Abaixo, há um vídeo que está na Internet com uma entrevista sua ao site Migalhas sobre o caso Battisti. Mais uma vez, ele reclama do jornalismo. Mas o faz de maneira bem particular.
Na sua egologolatria como advogado — vamos ver como será no tribunal —, doutor Barroso falou pra chuchu. E acho que acabou dando “bom dia!” a cavalo. Abaixo, há um vídeo que está na Internet com uma entrevista sua ao site Migalhas sobre o caso Battisti. Mais uma vez, ele reclama do jornalismo. Mas o faz de maneira bem particular.
Diz que
esteve junto com a imprensa em vários casos nos quais atuou: aborto de
anencéfalos, união civil de homossexuais, células-tronco… E confessa: “Ter a imprensa a favor é uma delícia”.
Mas repete a crítica feita no livro: no caso Battisti, ela estaria
contra. E AÍ O DOUTOR ACUSA, POR VIA OBLÍQUA, A IMPRENSA DE MANIPULAÇÃO.
Curioso o seu pensamento: quando a imprensa, então, está com ele, ela
não manipula ninguém e “é uma delícia”; quando não está, aí ela é
perversa. Aliás, a fala do advogado deveria levar muitos jornalistas a
refletir sobre a sua função: fazer a “delícia” de promotores de causas
ou ser independente. O vídeo segue abaixo. O trecho mais estupidamente
perturbador se dá entre 4min05s e 4min44s.
Voltei
Reproduzo a enormidade que disse o doutor:
“A política [na década de 70] pautava os processos políticos judiciais na Itália. As pessoas dizem: ‘Não, mas a Itália era uma democracia. Eu respeito e é admirável que a Itália não tenha sucumbido a golpes, mas a democracia italiana foi muito mais truculenta do que a ditadura brasileira. Morreu mais gente. Prisões preventivas de até oito anos… O sujeito ficava cinco anos preso sem ser denunciado, sem nenhuma culpa formada. Depois de algum tempo, aquilo passou a ser um leilão de distribuição de culpas” (…).
Reproduzo a enormidade que disse o doutor:
“A política [na década de 70] pautava os processos políticos judiciais na Itália. As pessoas dizem: ‘Não, mas a Itália era uma democracia. Eu respeito e é admirável que a Itália não tenha sucumbido a golpes, mas a democracia italiana foi muito mais truculenta do que a ditadura brasileira. Morreu mais gente. Prisões preventivas de até oito anos… O sujeito ficava cinco anos preso sem ser denunciado, sem nenhuma culpa formada. Depois de algum tempo, aquilo passou a ser um leilão de distribuição de culpas” (…).
Trata-se
de uma soma estonteante de disparates. De fato, são oficialmente 426
(estão tentando rever) as mortes atribuídas ao regime miliar, e as
esquerdas mataram, no Brasil, ao menos 120 pessoas. Na Itália, entre o
fim dos anos 1960 e dos anos 1980, morreram mais de 2 mil pessoas. Mas
atenção! Foram vítimas de terroristas de extrema esquerda (a larga
maioria) e de extrema direita. O estado italiano, ao contrário do que
sugere o doutor, estava combatendo o terrorismo, não se aliando a ele. A
afirmação é irresponsável no que concerne à história. Pode ter havido
um caso ou outro de desrespeito à lei, mas não era a regra. Pergunto: em
qual lugar o doutor gostaria de ter sido advogado nos anos 1970 (não
tinha idade para isso): sob o regime legal italiano ou sob o AI-5
brasileiro?
A vaidade
do doutor Barroso o fez se esquecer de que poderia chegar ao Supremo.
Daqui a pouco, estará na Suprema Corte brasileira um homem que, entre a
ditadura do AI-5 e a democracia italiana da década de 70, escolheria o
AI-5… Battisti vale tudo isso?
O vídeo
acima traz outros absurdos. Ao discorrer sobre o caso, fica evidente que
doutor Barroso trata menos dos aspectos legais que concernem ao Brasil e
dá maior relevo ao que seriam os erros e incongruências do processo
ocorrido na Itália. Vale dizer: defende, então, que o governo brasileiro
se comporte como Corte Revisora da Justiça de outro país, com o qual
mantém um tratado de extradição que nem denunciado foi. Mas isso,
reitero, é o de menos perto do que diz sobre a democracia italiana. É um
escândalo.
Não custa
lembrar que o último atentado das Brigadas não tem assim tanto tempo: em
março de 2002, o que restou do grupo assassinou o economista Marco
Biagi. Em 2007, 19 pessoas foram presas com fuzis, acusadas de pertencer
ao grupo. No ano passado, um ataque a um empresário levantou suspeitas
de que os facinorosos pudessem estar se reorganizando. A Itália
conseguiu esmagar o terror sem praticar terrorismo de estado, à
diferença do que sugere o futuro ministro do Supremo. Vamos voltar ao
livro.
Para que serve isso?
Não quero encompridar muito este artigo — ainda voltarei ao caso, mostrando como o futuro ministro, segundo ele mesmo, enganou os franceses numa entrevista e assinou a quatro mãos um artigo com qual, diz agora, não concordava… Encerro este post com um caso um tantinho constrangedor. O nome do subcapítulo 7.3 é “O que se faz com um alvará de soltura?”.
Não quero encompridar muito este artigo — ainda voltarei ao caso, mostrando como o futuro ministro, segundo ele mesmo, enganou os franceses numa entrevista e assinou a quatro mãos um artigo com qual, diz agora, não concordava… Encerro este post com um caso um tantinho constrangedor. O nome do subcapítulo 7.3 é “O que se faz com um alvará de soltura?”.
Era
meia-noite do dia 8 de maio de 2011. Após sair do Plenário do STF e ter
falado com a imprensa sobre a decisão favorável, saboreava alguns
minutos de paz e felicidade, tendo ao meu lado o Eduardo Mendonça e a
Renata Saraiva, advogados do escritório de Brasília, que trabalharam
comigo passo a passo no caso. Vindo não sei exatamente de onde, o
jornalista Felipe Seligman, da Folha de S.Paulo, me entregou uma via do
alvará de soltura, que havia obtido na Presidência do Tribunal.
Emocionado e perplexo, perguntei na roda que se formara: “Alguém sabe o que fazer com isso?”.
A pergunta não era retórica. Rodrigo Haidar conta esse episódio em um
saboroso artigo que publico como anexo desse texto. Depois de apurar
como funcionava a burocracia de tirar alguém da penitenciária, rumei em
direção à Papuda, para dar a notícia ao Cesare, pessoalmente. Luiz
Eduardo Greenhalgh estava lá na porta, com o filho, me aguardando.
Dei-lhe um abraço e combinamos que ele sairia com Cesare da
penitenciária. A partir dali, ele voltaria a cuidar sozinho dos
interesses de Cesare.
Entrei no
presídio e aguardei pelo Cesare na sala da direção, onde eu costumava
recebê-lo. Vinha feliz, emocionado. Mostrei a ele a cópia da ordem de
soltura, demos um longo abraço e fiz a ele duas recomendações finais. A
primeira: sem entrevistas, em um primeiro momento. Melhor se recompor,
rever os amigos, as filhas, sair da tensão. Mais adiante, se quisesse,
aí sim falaria com a imprensa, com calma, após algumas semanas. “Não se
deixe tratar como uma celebridade eventual. Você é um homem sofrido e
com história”. A segunda: não comentar nada sobre o STF, as diferentes
fases do processo e o sofrimento que viveu. “Olhar para frente, sem
ressentimentos”. Não comentar, seja para elogiar ou criticar. Cesare
cumpriu a palavra. Aliás, cumpriu-a todas as vezes em que se comprometeu
comigo. Estive brevemente com ele no lançamento do seu livro “Ao pé do
muro”. A dedicatória dele dizia: “Para Luís Roberto Barroso, sem quem
esse dia não teria chegado”.
Encerro
No vídeo que vai acima, o doutor diz não se apaixonar por processos, só por sua mulher. Excelente! Parece que o caso Battisti também derreteu seu coração. Sei reconhecer de primeira, desde moleque, a confissão de ignorância com que o falso humilde se põe acima dos mortais. Lembro lá do ginásio ainda. Um escamosinho tinha dinheiro para comprar lanche da cantina. Volta e meia ele me perguntava se meu pão com ovo frito era bom… “Nunca comi pão com ovo…”, dizia com falsa melancolia. Um dia dei um muqueta (não está no dicionário, mas o contexto explica) no nariz dele — e apanhei também, é claro. Melhor lutar com palavras.
No vídeo que vai acima, o doutor diz não se apaixonar por processos, só por sua mulher. Excelente! Parece que o caso Battisti também derreteu seu coração. Sei reconhecer de primeira, desde moleque, a confissão de ignorância com que o falso humilde se põe acima dos mortais. Lembro lá do ginásio ainda. Um escamosinho tinha dinheiro para comprar lanche da cantina. Volta e meia ele me perguntava se meu pão com ovo frito era bom… “Nunca comi pão com ovo…”, dizia com falsa melancolia. Um dia dei um muqueta (não está no dicionário, mas o contexto explica) no nariz dele — e apanhei também, é claro. Melhor lutar com palavras.
O doutor,
acostumado com as iguarias do direito constitucional, não sabia para que
servia o alvará de soltura, nunca tinha visto um… Espero que tenha
experimentado depois disso o pão com ovo do direito penal, né? Afinal, o
STF, salvo engano, além de ser um Tribunal Constitucional, também é uma
Suprema Corte que lida, frequentemente, com o pão com ovo do direito
penal. Ademais, cabe a ele processar e julgar originariamente uma penca
de autoridades, inclusive os próprios ministros do Supremo. Não achei
nem engraçada, nem humana, nem descolada a confissão de ignorância.
Cumpre lembrar, aliás, que a “470” é uma ação penal e atende pelo nome
de “mensalão”.
“Reinaldo
está fazendo carga contra o futuro ministro…” Não! Reinaldo está
cumprindo a sua obrigação. Se um futuro ministro do Supremo tem livro,
Reinaldo decide ler o livro. E conta para os leitores o que leu. Ler
ainda é um bom modo de a gente se instruir.
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