A entrega do Campo de Libra
(*) Heitor Scalambrini Costa –
No
leilão do campo petrolífero de Libra, marcado para dia 21 de outubro
próximo, o Governo Federal estará trocando por 15 bilhões de reais
(previsão de arrecadação) as reservas fantásticas que poderiam financiar
a educação, saúde e infraestrutura no Brasil em um futuro próximo.
Obviamente, pelo fato de a indústria do petróleo contribuir com mais de
50% da produção dos gases de efeito estufa, essa fonte energética deve
ser usada para fins mais nobres do que meros combustíveis.
O dinheiro arrecadado com o leilão vai para a conta única da união, e
quem sabe não será usado para pagar à eterna divida externa ou ainda
para pagar os juros da dívida interna para alguns acionistas de bancos?
Neste dia, a Agência Nacional de Petróleo (ANP) pretende leiloar o
maior campo de reservas comprovadas de petróleo brasileiro no pré-sal,
descoberto pela Petrobras em 2010, e uma das maiores descobertas
mundiais dos últimos 20 anos. Possui entre 12 e 14 bilhões de barris de
petróleo e está localizado a 180 quilômetros do litoral, na Bacia de
Santos, a 7.000 metros de profundidade.
Para se ter uma idéia do que representa este depósito de óleo basta
dizer que corresponde a tudo que já foi extraído pela Petrobras desde a
sua criação, há 60 anos, equivalendo também a todas as reservas do
México.
No leilão, participarão 11 grandes empresas petrolíferas. Além da
Petrobras, Petrogal (portuguesa, subsidiaria da Galp), Repsol Sinopec
Brasil (espanhola/chinesa), Mitsui (japonesa), ONGC (indiana), Petronas
(malaia), CNOOC e CNPC (chinesas), Shell (anglo-saxônica), Ecopetrol
(colombiana) e a Total (francesa).
A empresa ganhadora pagará 15% de royalties divididos entre a União,
Estados e municípios. Dos 5% que irão para a União, 75% serão destinados
para a educação e os outros 25% para a saúde. Estados e municípios
estão livres para investir em qualquer coisa. Portanto, atenção ao
percentual que realmente será destinado à finalidade social, pois é bem
inferior ao que diz a enganosa propaganda oficial.
A empresa que vai extrair o petróleo, descontando o custo real da
produção, deverá também entregar 50% do saldo em petróleo para a União.
Os outros 50% do petróleo serão das empresas, que certamente o enviarão
para seus países de origem sem pagarem impostos ou royalties.
Além disso, a área de exploração do Campo de Libra é um reservatório
totalmente conhecido, delimitado e estimado em seu potencial de reservas
em barris. Ou seja, esta área não é um bloco aonde a empresa
petrolífera irá “procurar petróleo”. Em resumo: um negócio excelente
para estas empresas, e péssimo para o país!
Por que a política nacional do petróleo, a cargo da Agência Nacional
do Petróleo (ANP), é contrária aos interesses nacionais e dirigida a
favor das transnacionais estrangeiras de petróleo? As denúncias contra a
ANP são graves, e vêm de todos os lados, apontando que este leilão está
direcionado ao cartel das multinacionais petroleiras para gerar
superávit primário.
A entrega do petróleo que a ANP está patrocinando fere o princípio da
soberania popular e nacional sobre a nossa importante riqueza natural
que é o petróleo, chegando a se constituir em crime de lesa pátria.
Na exploração do pré-sal não existe problema – nem técnico, nem
econômico – que o país não possa solucionar sem a presença das empresas
estrangeiras. Com relação ao saber fazer, a Petrobras é líder mundial de
tecnologia na produção de petróleo em águas profundas. Com relação aos
investimentos necessários, o BNDES que disponibiliza crédito para tantas
empresas privadas, inclusive transnacionais, bem que poderia emprestar
para a Petrobras.
O próprio Tesouro Nacional, em vez de pagar juros aos especuladores
de títulos da dívida interna, poderia investir, com bom retorno, no
pré-sal. E a Petrobras, uma das maiores empresas do mundo, certamente
tem crédito para conseguir empréstimos no exterior. Falta a decisão
política.
Legalmente, através da Lei 12.351, sancionada em dezembro de 2010, no
seu Art. 12, a União pode entregar o Campo de Libra, sem licitação,
diretamente para a Petrobras. Esta, por sua vez, assinaria um contrato
de partilha com a União, com o percentual do “óleo-lucro” (percentual
bem alto, para beneficiar ao máximo a sociedade) a ser remetido para o
Fundo Social. Assim se garantiria ao povo brasileiro o benefício total
dessa riqueza, no seu devido tempo.
Além do evidente “entreguismo” que está configurado neste leilão
patrocinado pelo Governo Federal, não se pode esquecer os recentes
episódios de espionagem que ocorreu sobre a Petrobras, e que, sem
dúvida, teve interesses econômicos na questão do pré-sal.
Isso, por si só, já recomendaria uma sensata suspensão deste leilão.
Mas o governo está irredutível e ficará com a pecha de ser aquele que,
de forma irresponsável, mais entregou as riquezas naturais do país à
iniciativa privada.
(*) Heitor Scalambrini Costa é professor da Universidade Federal de Pernambuco.
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